O mergulho nu (Ilha da Magia/ final).
– Vamos entrar na água, é isso, Cida?
– Eu vou! Vir até aqui e passar desapercebida dessas águas seria demais para o meu dia!
Cida acompanhou Catarina tirar os pequenos trajes até ficar totalmente nua. Os olhos faziam zoom em cada detalhe do seu corpo. Parecia um conto erótico de pura magia e sensualidade, parecia que a molécula d’água estava a sua espera para contemplar as camadas da pele.
Os olhos de Cida emitiam feixes de contemplação e aparvalhamento. Com olhares fotográficos, Cida arquivava as poses, o balanço dos cabelos quase molhados, o movimento da água ao redor do seu tronco, os longos braços que faziam movimentações circulares…
Catarina olhava suavemente para Cida e seus lábios se reduziam a um sorriso tímido e ao mesmo tempo faminto.
– Venha, Catarina! A temperatura da água está de murchar os dedos… Não sairei daqui tão cedo, acredito.
– Ei, Cida! Vou escrever um conto e te cuidar daqui da encosta, está bem?
– Olha, olha… Cuidar? Pois bem cuide de uma salva-vidas e aproveite a inspiração que essa Ilha te proporciona! Vá fundo que eu já estou!
“Quando eu resolvi entrar na água, o conto acabou”
Ela flutuava de pernas e braços abertos, de um canto ao outro, o balanço da cintura e a sensação de liberdade, chegavam até mim. Era linda, pragmática, inebriante e surreal. As ondas da água beijam seus lábios e a boca entreaberta bebia algumas gotas de molécula que iam e voltavam em ritmo lento em conformidade com as aves que faziam passagens num sobrevoo nu.
Ela emitia prazer e carinho, o silêncio da fala e a cantoria da fauna, fartavam-me de sensibilidade entre os dois seres, entre as duas vidas, entre o céu e a terra, entre eu e ela!
Entre nós duas, os elementos água e terra sendo atraídos por uma antítese modificada. Parecia que o meu corpo já não mais segurava as roupas e um mergulho nu poderia quebrar minhas palavras ao meio, transformando esse conto num encontro de peles.
Ela virou de costas, não resisti e joguei as palavras na água. Cada frase implícita, perdia-se na água e evaporava um verso umedecido. Segurei seus ombros como se agarrasse a coisa mais delicada daquela ilha, calmei a respiração para que a minha presença não a perturbasse. Ela virou de frente para meus lábios, observava com atenção aos meus pensamentos e tentava decifrar o que eu realmente buscava.
Eu busquei seu corpo, transportei-o até meus desejos. Busquei a boca, os lábios, a saliva, o ar e a falta dele, a respiração, os batimentos e os bradi e taquicardias, os movimentos e articulações com a falta de palavra, de silêncio, de incógnitas, de mistérios, de perguntas, de dúvidas, de tesão, de paixão, de raiva, de ira, de dor, de tristeza…De morte de tudo o que eu gostaria de fazer, pois eu sei que nada disso acabará como eu sempre faço em meus contos.
Cida, olhe para o movimento dos meus lábios e leia palavra por palavra. Cida, tire todo o cabelo por cima dos ouvidos e ouça palavra por palavra. Cida, preste atenção na antítese da minha fala e no meu silêncio desejado. Agora faça isso, pois eu vou falar:
– Não posso dar vida aos meus personagens. Não posso beijar o meu protagonista. Não posso acabar com as minhas pirações. Não posso fazer desse conto não sendo um conto, bem como dar vida aos sentimentos. Não posso sentir o gosto de um lábio fictício, isso modificaria o gosto que eu acho que possui. Cida, eu não posso te dar meus lábios, sendo que eu já tive e inclusive foi mágico, mágico, mágico. Eu não posso dizer as coisas da boca pra fora, eu não poderia dizer mais nada, eu não deveria gostar de ti, eu não deveria provar o teu verdadeiro gosto…
Eu… Eu preciso voltar para o papel e mergulhar nos teu braços até o dia amanhecer, meu amor!